terça-feira, 26 de maio de 2020

Assumindo o medo


Diário da Astróloga: 26.05.20 | Na cena do filme "Um corpo que cai", o diretor Alfred Hitchcock traduz, como mestre do suspense, o pavor da queda livre. Ultimamente, cenas do cinema e da vida real têm se misturado simbolicamente, dentro e fora de nós.
No Brasil, não é incomum acordarmos com medo. E não apenas pelo volume maciço de notícias trágicas, mas também pela sensação real de que o Brasil tomou um caminho muito peculiar na maneira de lidar com o seu próprio caos, ampliando-o em escala nunca imaginada, também como se estivéssemos em queda livre. E em dias de Marte em Peixes e Lua em Câncer, as sensações de fragilidade e vulnerabilidade são ainda maiores. O medo atravessa nossa maneira de ver o mundo, nosso comportamento, correndo por debaixo da pele até transtornar as nossas almas. E quando este sentimento vem, o melhor não é lutar contra ele ou fingir que ele não existe. Mas dar-lhe a mão, assumindo que o medo está entre nós.
No Brasil especialmente, acredito que vivemos duas mitologias opressivas e inconscientes que dificultam ainda mais a nossa lida com a realidade: A TIRANIA DA ALEGRIA, em que ninguém pode se mostrar triste, melancólico ou introspectivo. A Lua em Gêmeos no mapa natal do Brasil exige piadas e risadas em fluxo contínuo. Mas, na vida real ninguém é tão leve e divertido o tempo todo. E a TIRANIA DO SUCESSO, onde somos proibidos de dar um "passo atrás" no jogo da vida. De modo que quando o sujeito perde o emprego, o aluguel da casa, tem de se ver com um carro mais modesto ou voltar ao transporte público é visto como um excomungado, embora seja uma pessoa trabalhadora e lutadora como a grande maioria de nós. Por essas e outras eu diria que os brasileiros nem sempre são gentis consigo mesmos. Talvez seja a autocrítica tão comum em Virgem, o signo solar deste país. Como se já não bastassem as cobranças do mundo, há também uma autocobrança tremenda. Quando na verdade bastaria o legítimo desejo de alcançar a felicidade de existir.
Neste processo único e histórico que estamos vivendo, com tantos desafios diários, é preciso haver mais gentileza, auto gentileza. E isso passa necessariamente por assumirmos que a vida é e está cada vez mais frágil e que estamos vulneráveis, suscetíveis a vontades outras que não as nossas. 
Acredito que para alcançarmos algum equilíbrio psíquico diante das circunstâncias precisamos aceitar antes de tudo nossa fragilidade e se possível falar dela. Sigmund Freud e Carl Jung nos ensinaram que as palavras curam. Pois façamos uso deste veículo, que Gêmeos tanto aprecia, para dizermos o que se passa dentro de nós. Quando assumimos que estamos acuados e com medo, nos livramos de parte desta carga inconsciente, silenciosa e paralisante. De modo que depois que verbalizamos, parece que finalmente se abre diante de nós uma possibilidade de sentir diferente. Assumir o medo é antes de tudo um ato de bravura. Agora não é hora de ser "o bem sucedido" ou "o mais feliz da festa". Agora é hora de sermos honestos conosco, deixarmos de lado alguns dos nossos comportamentos superficiais para irmos a fundo em nós mesmos. E se a exposição legítima dos nossos medos for motivo de incômodo para alguém, talvez seja o caso de repensar o compromisso existente em alguns relacionamentos. 
Que este "filme de terror" sirva para nos levar ao que verdadeiramente somos!
Aline Maccari Jornalista, Astróloga e Analista Junguiana

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CRÉDITOS: Cena do filme "Um corpo que cai" de Alfred Hitchcock
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