Há um trecho de um texto, que acho interessante, cuja autoria seria atribuída a Machado de Assis. Ele teria dito: "... o pecado dos homens foi ter confundido o amor com o casamento e a religião com a igreja." Essa frase me veio à mente hoje, no primeiro dia do ano 2139 do calendário budista tibetano, o ano do Dragão de Água. Na intenção de acumular méritos num dia tão auspicioso fui estrear minha virada bem cedinho, num templo longe de casa, atirando arroz, circundando construções santas e entoando mantras numa língua que teimava em aprender há alguns anos. Diz-se que as três jóias do budismo são o Buda, não um deus, mas um irmão iluminado que nos inspira a sair do Samsara ou inferno, esse "mundím" difícil em que vivemos. E ainda o Dharma que são os ensinamentos e a Sangha, a comunidade budista. Esta tem seu poder reconhecido a partir do momento em que se entende que somos muito mais fortes quando unidos, onde um pode ensinar e ajudar ao outro. Sempre tive uma grande afinidade com a filosofia budista e há tempos não ia até lá. Logo que as comemorações tiveram início me lembrei porque andava tão ausente. Sentei-me nos fundos. Ao meu lado direito ex-evangélicas entoavam os mantras em alto tom, como se o volume da voz fosse garantir-lhes uma vaga mais rápida no reino dos céus, o Nirvana. Do meu lado esquerdo ex-católicos oprimidos fitavam o altar cheio de deidades nuas sem entender ainda o sentido do pecado na nova religião. À frente um rapaz vestindo com uma camiseta escrito Free Tibet, soprava uma concha gigante que pertencia ao ritual, até perder o fôlego. E uma moça tatuada até a nuca falava com a colega ao lado sobre uma sapatilha colorida comprada numa boutique para pseudo iluminados. Atrás de mim estava o pequeno Buda, um garotinho que ria e se divertia com a chuva de arroz. Olhando a cena me lembrei como a imagem de Buda se tornou figura fácil e desprendida de significado com sua reprodução em camisetas e esculturas caras em lojas de decoração. Ao final, uma ceia vegetariana deveria irmanar o grupo que envolto à pirotecnia extravagante de uma cultura estrangeira se perdeu do Dharma tempos atrás. O maior pecado da Sangha foi como Machado alertou, confundiram a essência do conhecimento com a "instituição" da qual faz parte. E o meu casamento com aquela comunidade já não despertava mais o amor verdadeiro de uma união sincera. Assim, o ano novo não poderia começar com uma mensagem mais clara. O 2012 ou 2139 segue com Plutão em Capricórnio, avisando que a institucionalização dos nossos sentimentos mais sublimes é coisa do passado. O sentimento seja ele búdico ou não, mora antes no coração. Autenticar em cartório qualquer emoção que ainda nem foi despertada é que me parece pecado. Esta quarta-feira de cinzas segue ainda com Sol em conjunção com Netuno, nos fazendo lembrar do amor e da transcendência. E a Lua segue em Peixes iludindo ou iluminando. Afinal tudo começa e termina na orientação que damos à nossa intenção. Saindo antes do final da ceia mandei um beijo para Buda, agradeci pelo ano passado, desejei um ano abençoado e mandei lembranças a Machado.
Aline Maccari
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Que neste ano os chineses sejam varridos por Plutão das terras tibetanas. Em paz é claro!
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