FACULDADE DE
CIÊNCIAS DA SAÚDE – FACIS
INSTITUTO
JUNGUIANO DE ENSINO E PESQUISA – IJEP
A SOMBRA NA CONTEMPORANEIDADE:
O MESTRE BUDISTA, O DISCÍPULO E A RELAÇÃO COM A
SOMBRA
Especialização em
Psicologia Junguiana
BRASÍLIA
2015
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INTRODUÇÃO
Sacerdotes,
gurus e demais mestres espirituais sempre tiveram um papel inegável. Sua função
social é intermediar o contato com o divino, ajudando o sujeito a entrar em
contato com “deus” ou pelo menos com a divindade que existe dentro de cada um
de nós. Eles facilitam esse processo clareando caminhos, trazendo lucidez,
informação, método, disciplina, sentido, inspiração e senso de propósito. Na
linguagem junguiana esse encontro com a chama divina, o numinoso, seria o
encontro com o verdadeiro self ou o si-mesmo. Um papel delegado na pós modernidade
também a outros profissionais tais como psicólogos, analistas e terapeutas. Entretanto
estes não serão tratados nesta pesquisa, mas apenas os mestres do budismo da
tradição tibetana.
A questão é que esses mestres, conhecidos
por serem os “detentores do conhecimento oculto sagrado”, têm cometido vários
equívocos, fato constatado pelo senso comum por meio de relatos e notícias na
mídia, dia após dia. No entanto, seres humanos como quaisquer outros, não seria
razoável que isso fosse minimamente compreensível? A questão é que muito
comumente buscadores, discípulos e mesmo a sociedade de um modo geral, não
encaram o tema desta forma. E por que isso acontece? Bem, uma das hipóteses é
que devido a altas expectativas por parte dos discípulos essa é uma relação que
já começa de forma desequilibrada. Geralmente o discípulo enxerga o mestre como
alguém com habilidades especiais, que transita entre “a terra e o céu”, como quem
tem poderes sobrenaturais, reforçados por tradições, regras, histórias, mitos e
livros sagrados. Por causa dessa premissa básica de que o mestre ainda é aquele
que faz a ponte entre os homens e os deuses, os discípulos se sentem muitas
vezes inibidos, despreparados ou mesmo incapazes de avaliar o nível de preparo
do mestre. Como se duvidar dele ou do processo espiritual fosse uma ousadia
imperdoável. Outra mística que acompanha o trabalho espiritual é a expectativa
de altíssimos resultados. Fator que pode isentar o discípulo de boa parte do
árduo trabalho espiritual, eximindo-o dos esforços necessários a práticas
complexas que podem ser bastante cansativas, no entanto, pessoais e intransferíveis.
Do ponto de vista do mestre também há
algumas armadilhas possíveis como, por exemplo, quando essa “autoridade
religiosa” se sente tentada a ocupar inapropriadamente uma posição de poder,
identificando-se com uma persona onipresente,
onisciente e onipotente, assumindo a postura de um verdadeiro deus, deixando-se
tomar por um complexo poderoso. Essas
e tantas outras possibilidades de relação entre mestre e discípulo podem gerar
uma dinâmica de sabotagem que pode levar ambos a caminhos bem distantes do self. O que seria um desvio do objetivo proposto,
uma vez que muitas pessoas realmente necessitam de orientação psicoespiritual. Uma
situação que pode chegar até a consequências desastrosas, nefastas, como a
pedofilia, o abuso de drogas, a promiscuidade sexual, como veremos mais à
frente.
O que motivou a pesquisa sobre o tema foi a
frequência com que passamos a ter conhecimento, por meio de notícias, sobre
relações mestre-discípulo que tiveram consequências negativas. Diante disso as
perguntas mais importantes que poderíamos fazer acerca do tema poderiam ser: será
que esse contato com a sombra,
durante a dinâmica religiosa, é positivo ou negativo? Até que ponto o trabalho espiritual
desenvolvido entre mestre e discípulo pode levar à revelação ou à alienação? E
dentro desta perspectiva, como distinguir o que seja revelação de alienação? Será
o confronto com a sombra uma
possibilidade de revelação? Afinal, se o lama budista, que é preparado
geralmente desde muito cedo a prover orientação espiritual e tornar a si mesmo
exemplo de conduta, como e porque em alguns momentos ele se perde no caminho produzindo
consequências desastrosas para si e para os outros? Por que alguns mestres
incorporam o tipo invencível, a persona
de um salvador, e não reconhecem suas fraquezas? Segundo Jung, ninguém vive sem
sombra, nem mesmo os mais altos
sacerdotes. Aliás, é justamente por trabalhar na perspectiva da busca da luz
que a sombra torna-se diretamente
proporcional, tão grande quanto a luz. Quem mais trabalha em busca de
iluminação mais sombra guarda em si.
Uma resposta plausível para essa difícil
questão poderia estar na questão da persona.
Uma forte identificação com a máscara de sacerdote ou de iluminado é algo muito
difícil de ser questionado pelo discípulo. E é isso que tentaremos mostrar. Pois
a identificação com uma persona de
construção social tão poderosa dificulta o confronto do sujeito com a sombra, podendo gerar forte alienação. Como o
próprio Jung afirma, a sombra é algo constitutivo
da alma humana, não há como negarmos um encontro com ela, principalmente quando
a intenção do trabalho é espiritual.
Para falar sobre persona e sombra
utilizaremos como base teórica a obra de Carl Gustav Jung. Pois que outra
teoria senão a analítica, que trata exatamente desses conceitos, complementares,
compreenderia melhor essa dicotomia entre complexos? Além disso a filosofia budista e a psicologia
profunda possuem muitos pontos de convergência quando tratamos de dualidade. Para
isso utilizaremos os principais livros da obra de Jung, textos e livros que
tratam do tema no âmbito do budismo e reportagens que mostram dramas reais que
aconteceram entre discípulos e mestres do budismo tibetano.
A pesquisa se compõe de (...)
O objetivo desta pesquisa é trazer
consciência para(...)
* A tese completa pode ser requisitada por meio do e-mail alinemaccari@gmail.com
Aline Maccari